Atelier






No estrelado estábulo,
o avariado telhado
que se abre ao infinito.
Outrora, 
cosmologias ptolomaicas
pintadas em dourados tetos
de palácios renascentistas,
lembravam o dantesco cosmos
em abóbodas palacianas
envoltas em estático zodíaco.

Surge o cavaleiro andante
e seu fiel escudeiro.
Descobre o orifício no teto da venda:
a perturbadora presença do infinito,
entre o lastro do passado e a leveza do futuro,
a corrosiva força do tempo
em dinâmica exibição.
O artista a depender do contingente
diante do imponderável...

Ao imprevisto
restrito e liberto,
rígido e adaptável
se entregarão Sterne
Joyce, Proust,
e o neurótico Flaubert,
no átimo que elide o tempo.

No estrelado estábulo
os instantes são dispersos
e inumeráveis,
o cosmos, ilimitado,
a descobrir-se em suas formas,
- se é que alguma há.
A pequenez do indivíduo exposta
em siderais imensidões.
A ironia de Montaigne,
o improviso de Cervantes.

Em seu famoso atelier,
Velázquez pondera,
todavia,
a próxima pincelada. 


E.S.C., setembro/14

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